araken-galvao

Continuando com o assunto usado na semana passada, posso lembrar que não faltava, porém, quem afirmasse baseado em Antenor Nascentes, fazendo uso das informações contidas em seu “Tesouro da fraseologia brasileira”, na qual o autor enumerava outras teses. Uma delas (de Mário Sette) dizia respeito aos trajes de linho que os ingleses usavam em Pernambuco (ou seja, a influência inglesa na moda masculina), diferentes dos de casimira preferidos pela população local – o que levava certos brasileiros gozadores, sempre que viam um nativo trajando linho, a dizer que ele só se vestia assim “para inglês ver”.

Estas são explicações fáceis, do tipo daquelas relacionadas com forró, a qual muitos, (e com bastante razão) discordam.

Essa expressão “para inglês ver” é comumente utilizada – como já relatei – na língua portuguesa no sentido de algo que é aparente, mas não é válido ou real. Existem algumas teorias sobre o surgimento deste ditado, no entanto, a mais aceita diz que teria se originado por volta do começo do século XIX[1]. A história conta que a Inglaterra, naquela época, pressionava o Brasil e o Império Português a criar leis que impedissem o tráfico de escravos para o país. O governo brasileiro, sabendo que tais regras nunca seriam cumpridas no país, criou leis falsas que, teoricamente, impediam o comércio da escravidão no Brasil. Porém, eram leis apenas para os ingleses verem e pararem de pressionar os líderes do país. Convencionou-se, a partir deste episódio, utilizar a expressão “para inglês ver” como forma de nomear as leis demagógicas, que não possuíam qualquer tipo de funcionalidade prática. Atualmente, “para inglês ver” é uma expressão que está relacionada tanto com a hipocrisia, como com a mentira, pois tem a finalidade de ludibriar as pessoas, ao pensarem que determinada coisa é ou funciona de um modo, quando na verdade não é bem assim, pois o é de mentirinha.

Entre as teses enumeradas por Nascentes, a mais rica em detalhes – talvez rica demais para ser crível, mas o estudioso anota que Gilberto Freyre e Afonso Arinos lhe deram crédito – é apresentada por Pereira da Costa em seu “Vocabulário pernambucano”:

Tocando na Bahia na tarde de 22 de janeiro de 1808 a esquadra que conduzia de Lisboa para o Rio de Janeiro a fugitiva família real portuguesa, e não desembarcando ninguém pelo adiantado da hora, à noite, a geral iluminação da cidade, acompanhando-a em todas as suas sinuosidades, apresentava um deslumbrante aspecto. D. João, ao contemplar do tombadilho da nau capitânia tão belo espetáculo, exclama radiante de alegria, voltando-se para a gente da corte que o rodeava: ‘Está bem bom para o inglês ver’, indicando com um gesto o lugar em que fundeava a nau ‘Bedford’, da marinha de guerra britânica, sob a chefia do almirante Jervis, de comboio à frota real portuguesa.

Dessa forma, e também por conta da vinculação política estabelecida desde a chegada da Corte portuguesa ao Brasil, em 1808, mais tarde, depois da Independência e da abdicação, mesmo no período da Regência, a dependência para com a Grã Bretanha se manteve e até aumentou, em função disso a pressão britânica era intensa, o que levou o Governo que administrava o país em razão da menoridade do príncipe Dom Pedro II, a promulgar uma lei, em 1831, que declarava livres os africanos desembarcados em portos brasileiros desde aquele ano. Mas o sentimento geral era de que a lei não seria cumprida, fazendo circular pela Corte, inclusive na Câmara dos Deputados, o comentário de que o Regente, padre Feijó fizera uma lei só “para inglês ver”.

Aliás, de todas essas exposições, fica evidente que não é muito fácil de determinar com precisão como surgiu uma expressão popular de um povo. Aliás, nosso país é rico em possuir tais frases. Muitas deles, mesmo com o correr do tempo, persistem, como, por exemplo, “Quem nasceu para dez reis não chega a vintém”, cuja origem deve ser muito antiga, uma vez que essas moedas fazem muito que desapareceram.

Outras há, com clara origem indígena (ou cabocla), como “A hora da onça beber água”, a qual, se levarmos em conta que este felino só existe na América, com destaque para a onça pintada, o maio felino das Américas – só podemos admitir essa origem, mesmo porque nos outros países do nosso continente, não só é mais comum a suçuarana, como em nenhum deles existe a palavra onça.

Inclusive uma há que permitiu ao ex-presidente Collor de Melo meter-se em uma grande trapalhada; ao falar com jornalistas hispano-americanos, desejou usar uma dessas expressões, bem nossa: “Doa a quem doer”, resolveu traduzi-la, desconhecido (ou não levando em conta) que essas expressões o são idiomática, significando isso que são em sua maioria intraduzíveis, então mandou: Duela a quien duela, deixando perplexos os jornalistas que não sabiam que diabo era aquilo.

Todas essas aventações levaram-me a lembrar de um folheto antológico, publicado por volta de 1963, com o título “Um Dia na Vida de Brasilino[1]”, escrito por Paulo Guilherme Martins, que abordava essa adoração basbaque do modo de vida das classes ricas dos Estados Unidos, por parte dos jovens da nossa classe média, para concluir, depois de aventar sobre a forma como estava ocorrendo a dominação estadunidense em nosso país (e no mundo), dizendo que “Não sei porque, mas a história do Brasilino traz sempre, à mente, – aquelas magníficas palavras do Sermão da Montanha : “Bem-aventurados os pobres de espírito porque será deles o reino dos céus.”

Mas uma coisa jamais será do Brasilino: O REINO EM SUA PRÓPRIA TERRA.

E assim termino minha crônica, sobre este curioso assunto.

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[1] http://www.significados.com.br/para-ingles-ver/

[1] Que pode ser lido em: http://www.geocities.ws/vozdovelho/brasilino.html Valendo a pena dar-se uma olhada.

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