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(Pequenas histórias de Valença – Amália Grimaldi)

 

Choveu. Ao fundo de uma poça rasa alcançar-me-ia o rumor de pedras alvas. Além do óbvio efeito, como num eco de luzes, assistia o tremido reflexo de uma folha seca, aquela que de sujas calçadas muito rolou ao vento, sem retorno à sorte. Da árvore morrida, o descuido moveria o gozo e o que suportaria o frágil ninho da ave ausente. Momento único. Da cúmplice natureza, essa graça que passa, dessa árvore nua a folha rolada retornaria um dia, em outras tantas que surgiriam. Sim, esta árvore existiria, porque nunca morreu de verdade.

Infância rabiscada. Pintada e cantada. Ivo já tinha visto a uva fazia tempos. Mulher letrada, hoje sou cidadã do mundo. O medo do mau. O medo da morte súbita, fraqueza comum a todo ser. Na solidão preenchida de muitos escritos, penso juntar o passado ao presente, e possivelmente meu futuro legado. Cores mágicas na transparência de celofanes  de festa alimentavam a ilusão de tempo bom. Tão frágil quanto a efemeridade de um colorido aljôfar era a frágil sensação de felicidade, de natais e carnavais enfeitados.

Vovó, o que vamos comer amanhã?  Deus proverá, minha filha... Depende da maré. Respondia sabiamente vovó Madalena. Na verdade havia sempre uma preocupação com o amanhã.  Mas, o ambiente envolvente era tão generoso, assim com toda a gente. Grãos de sentimentos híbridos semeavam uma prolífica jardineira. Um sistema de trocas entre vizinhos e amigos, certamente valia mais do que dinheiro na mão. Áspero chão, limbo do ser. Minha cartilha de vida. Pátio de noites insones. Aves migrantes dão forma aos seus pensamentos, e voam, além de antigas consoantes, pois nas vogais da minha fé ouço rima inteligente.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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