Raimundo Magalhães Costa, 54, presidente da Colônia de Pescadores Z15 desde 2009, ex-presidente da Câmara de Vereadores e ex-vereador de Valença, foi eleito no último dia 23, por unanimidade, presidente da Federação de Pescadores e Aquicultores da Bahia (FEPESBA), durante Assembleia Geral Ordinária realizada pela entidade, para escolha de sua nova diretoria. A posse dos eleitos para o triênio 2015/2018 acontece no próximo dia 21 de dezembro no Sol Bahia Hotel, na cidade de Salvador.

Morador e filho de Valença, Raimundo foi ainda presidente do Palmeiras Futebol Clube, no bairro do Tento; é casado com a vereadora Vane Costa e tem quatro filhos. Conversou conosco sobre o novo momento de sua vida em que assume o mais alto cargo de representação dos pescadores do Estado da Bahia.

 

Raimundo, qual a importância de se ter hoje um filho de Valença à frente de uma Federação com projeção estadual?

 

Primeiro quero agradecer a gentileza do Jornal Valença Agora em poder fazer esse registro pros pescadores da Bahia, especialmente da região e Valença, desse momento que nós estamos convivendo. Particularmente, pra mim, isso já faz parte do nosso cotidiano, a gente não vê com muita ansiedade porque já convivemos com essa realidade desde 89 quando Zé Carlos assumiu a Federação. Percebemos a necessidade do setor de ter uma representação, onde em cada município que tem as Colônias pudessem ter o sentimento dessa representação. Quando Zé Carlos entrou, nos convidou a participar, por isso que eu digo que pra mim é um momento que eu sinto de forma natural, mas entendendo que é um momento que nos honra muito e ao mesmo tempo nos deixa com aquela ansiedade de querer poder fazer mais, honra porque a gente está tendo a possibilidade de ocupar o mais alto cargo que o setor pesqueiro possui no Estado. E, a ansiedade e a satisfação é de poder saber que a gente pode, dentro das nossas possibilidades, implementar e potencializar as ferramentas que a Federação possui.

 

Você está na Federação desde 1989, sempre foi assediado pra ter postos de mais destaque, de maior visibilidade, até mesmo pra que tivesse maior representatividade, mas isso sempre foi ocupado por Zé Carlos. Zé Carlos agora se afasta e naturalmente você ocupa a função dele. Esse projeto existe também a necessidade de uma representação política da Federação para a defesa da classe, isso pode se criar uma expectativa de que Raimundo Costa será candidato a deputado federal?

 

Eu acho interessante voltar um pouquinho no tempo, antes de eu estar na Colônia e aí eu acredito o porquê de hoje a gente estar vivendo esse momento. Acho que nós temos uma missão, ninguém se mantem num espaço, num ambiente que não tenha um alicerce.Eu, aos oito anos, via meu pai sair de madrugada, e eu dizia, ‘poxa meu pai está saindo pra pescar pra me dar comida’, pra ajudar nossa família, e que era um momento difícil, a pescaria era braçal, era uma produtividade maior, eu me lembro que as pessoas comentavam que ele doava parte da produção, o pouco que ele ganhava ele conseguia dar o alimento, ter canoa própria, ter barco, ter uma casa, uma família.Eu pensei,‘eu preciso um dia retribuir a ele’, e toda vez ia pescar, ele dizia, ‘não, vá estudar, já basta eu que tô aqui porque não tive oportunidade’, na simplicidade dele, mas tinha uma sabedoria muito grandiosa.Me formei em Contabilidade, fui trabalhar na cooperativa, e ele foi ser presidente da Colônia, eu fui pra Colônia ajudar ele, porque tinha que prestar conta, a partir daí a gente foi de forma natural, sem nenhuma intenção política, começando a abrir espaçoe eu fui descoberto politicamente por Gigi, ele disse, ‘você vai ser candidato’, eu disse,‘eu não’, e ele insistiu,  resultou logo depois no nosso mandato (na Câmara de Vereadores de Valença), e nós construímos o mandato que tinha como foco a pesca.Temos hoje a percepção de que nós somos importantes, e é isso que a gente tem construído no decorrer da nossa caminhada, a melhora da autoestima dos pescadores, a ciência de que todos nós somos importantes e que temos que acabar com a invisibilidade social que não nos permitia a visibilidade política. Isso que nós construímos, é uma construção com Zé Carlos que a gente fez esse entendimento de interação, de entender de que forma a gente pode melhorar o setor.

 

Raimundo, o que a sociedade pode esperarde você enquanto presidente, em relação aos benefícios que você pode construir para a classe dos pescadores?

 

Primeiro, nós só teremos sucesso se a gente manter essa autoestima, mesmo com as dificuldades, mesmo com os nossos problemas, se a gente conseguir manter, acredito que a gente tem toda possibilidade, porque nós já estamos nessa manutenção de autoestima e aí, é fazer com que os nossos direitos não se percam porque não se pode retroagir, e os avanços é preciso. Eu sou apaixonado pelo município, sou municipalista, não posso entender que a União possa fazer muita coisa, se o município não provocar, porque é perversa a forma da distribuição de renda, tanto, a forma que se arrecada da União para o Estado e para o município é perversa porque aqui se produz tudo, todas as riquezas desse país estão nos municípios.Então, para o pescador, a minha missão assumindo a Federação é estimular as Colônias de Pescadores a fazer com que os municípios de alguma forma, provoquem o Estado e a União a trazer recursos para aplicar na atividade.A gente precisa preparar a sociedade, os municípios para que ofereçam ao pescador e ao filho de pescadoroportunidades para que vá a Escola, mas que volte pra atividade porque é salutar, é saudável, é orgulhosa de você poder produzir o melhor alimento do mundo, o melhor alimento natural que o ser humano pode consumir, então está em nossas mãos, na pesca artesanal, na industrial e na aquicultura, poder potencializar e fazer disso uma política, um programa de governo.

 

Escola de Pesca que ainda existe, não conseguiu até hoje, ao longo dos anos, desenvolver nenhuma atividade que viesse beneficiar o pescador diretamente. Poderia se ter em nosso município uma mini-indústria de enlatados, uma série de outras coisas que agregassem valor a essa matéria-prima. De que forma a Federação pode provocar para que essa Escola venha a ser mais utilitária para a nossa região?

 

Justamente provocando para que as políticas públicas aconteçam, porque na hora que você coloca um filho de pescador na escola, quando ele sai, ele sai com o mundo com um horizonte gigantesco. Agora, como é que ele vai aplicar os estudos que ele aprendeu?A gente precisa ter investimento, precisa ter embarcações e ferramentas, mas precisa saber que essas ferramentas que ele vai utilizar sãosustentáveis e você precisa não só formar uma boa escola, mas você tem que fazer pesquisas, tem que conhecer um pouco das nossas duzentas milhas. Precisamos levar a possibilidade de ir à escola, que o Governo não perca esse programa de que tem que ter investimento. Nós temos o que há de melhor nesse Brasil, temos que tentar mudar aos poucos, sei que talvez eu não consiga no meu mandato agoramontar tudo isso, mas esse sentimento do pescador perceber que ele é importante, que ele produz, que ele é eleitor, que ele elege governador e prefeito, nós já começamos a construir. É um passivo que a sociedade brasileira tem no setor que a gente quer passo a passo ir buscando, mas não tenham dúvidas que o nosso mandato vai ser um mandato focado nessa valorização e provocação do Estado e município para tenha políticas públicas em benefício, principalmente da produção da pesca.

 

A Confederação em conjunto com as Federações desenvolveu uma ação para desfazer um projeto que já estava no Senado, que iria provocar a liberação da pesca dos peixes quando ovado. Quala importância dessa ação para a área pesqueira e para o futuro da pesca?

 

Nessa pergunta, temos que registrar a importância da organização. Porque imagine as decisões que estão sendo tomadas em Brasília, porque a gente elege deputado para que seja nosso porta voz, mas, quem é o pescador pra ser representado?Ser reconhecido, se estou falando aqui na invisibilidade social e política? Mas,nós temos no sistema, as Colônias, a Federação que representa em nível de Estado e a Confederação em Brasília. São todos eles, um pescador do município que está tendo representação em Brasília. Infelizmente, desde o dia 30 de dezembro de 2014, o governo federal tem provocado no nosso setor uma imensa instabilidade psicológica, porque as medidas que o governo tomou, achando que nós poderíamos também pagar parte da conta, quando no passado mês de janeiro, decidiu que era preciso, ao invés de 1 ano, comprovar três anos de pesca para ter acesso ao Seguro Defeso. Ou seja, três anos sem alguém receber um centavo, pescador é proibido de estar na natureza pra pescar, ele já não tem dinheiro de ter o direito de se manter em casa, é uma catástrofe. Outro dia, a ministra de Agricultura, (fusão do Ministério da Pesca) Kátia Abreu baixou uma portaria com o objetivo de evitar fraude e fazer o recadastramento para reconhecimento de todos aqueles que fazem parte do benefício, suspender a portaria 192 que permite que se pesque em vários Estados do Brasil, inclusive na Bahia, a pesca do robalo e a piracema, que é o peixe em rios, açudes e barragens, ou seja, no período da desova, o peixe, a partir dessa portaria, poderia ser comercializado, numa crise hídrica, o governo permite que se pesque a espécie de um ambiente que já está quase morrendo. Então, aConfederação percebendo isso, articulou-secom o Congresso, mostrando aos deputados que o Meio Ambiente já agoniza uma crise, conseguiu mês passado, fazer um decreto legislativo, fazendo com que aquela portaria perdesse seu efeito, conseguimos aprovar por unanimidade. O Governo deve atuar em cima de combater a fraude, não prejudicando o meio ambiente e as pessoas, e o Congresso entendeu isso. Se existe fraude é porque o próprio governo permite, porque não é são as Colônias, nem a Confederação que faz seguro, é umórgão do governo.

 

Em nossa região existe uma área de estuário muito grande. Existe algum projeto ou alguma ideia de utilização desses estuários em prol dos pescadores?

 

Não tenha dúvida, porque a segunda casa do pescador depois da casa familiar, é o rio, é o mangue e é o mar, então nós dependemos do estuário livre dessas lesões e dessas pressões da sociedade. Só podemos usar o manguezal se ele estiver saudável, infelizmente nossos municípios brasileiros, poucos possuem esgotamento sanitário, isso impacta na vida do pescador e na vida das espécies, caranguejos, sururus, lambretas,ostra, etc. A cada dia que passa você vê o mangue, as indústrias, o comércio jogando todos os dejetos orgânicos, industriais, químicos,no rio.A gente precisa provocar, talvez seja essa nossa maior missão de focar no município porque na hora que ele protege o meio ambiente, diretamente está beneficiando o pescador, uma ação que o município toma com o Estado e a União de desviar esses dejetos do manguezal, diretamente está beneficiando toda a sociedade. É a percepção do município, do Estado e da União, entender que existe uma correlação e responsabilidade de aplicar programas que beneficiem o pecador e a partir daí estimular, qualificar, investir na atividade pesqueira.

 

Suas considerações finais.

 

Mais uma vez agradecer a oportunidade que nos dão de conversar com os leitores do Jornal Valença Agora para passar essa mensagem de agradecimento às Colônias que nos elegeu. Lancei achapa no último dia, pra ver se alguém ia se manifestar e se quisesse eu recuaria, até porquenão era projeto meu pessoal... em time que está se ganhando não se mexe, e se eu não tivesse hoje na condição de presidente, estivesse na condição de secretário, teria o mesmo afinco de desenvoltura no interesse de defender, porque é oque a gente faz, o que a gente vive, é a nossa missão. Mas é isso, aconteceu de forma natural, a gente quer agradecer a Deus e pedir o apoio de todos, e que a gente possa daqui a três anos fazer um balanço de avanço naquilo que a gente almeja, a autoestima, a valorização, e a percepção e o Valença Agora é a primeira testemunha desse projeto mais filosófico da gente perceber que o município está pensando diferente. Que qualquer ação que o município faça, que leve benefício parao meio ambiente, ele está valorizando a gente, está estimulando e contribuindo pra que a gente se insira no processo. Agora, é claro, o município sozinho não é responsável por tudo, a gente tem que entender que tem que criar essa via de mão dupla. Pra isso tem a entidade, pra conscientizar, provocar, fazer, a gente quer dentro desse mandato poder fazer o melhor pela pesca, pelos pescadores e por Valença. Quero agradecer as palavras de conforto, os telefonemas e as manifestações de satisfação de ter um valenciano presente nessa mais alta representação estadual, que a gente posso no decorrer do nosso mandato orgulhar mais ainda.

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