Eduardo Pereira*

 

Nascido na década de 1960, na comunidade da Burundanga, Município de Pilão Arcado-BA, Nicolau Conceição do Rosário, desde cedo destacou-se como um estudante brilhante. Concluído o curso de Magistério, único oferecido na região,após anos sem achar um emprego, ingressou no ano de 1985 no Colégio Estadual da cidade de Remanso-BA, na carreira de professor, indo lecionar História.

O agora professor Nicolau, mesmo sem ser licenciado, a sua dedicação o colocava numa posição de destaque no mencionado Colégio; representante regional do sindicato dos professores, tornara-se uma liderança, ao menos era o que pensava, quando na verdade era usado pelos seus colegas que, devido a sua atuação sindical, conseguiam aumentar seus salários.

A militância sindical, lhe aproximara de lideranças políticas estaduais e nacionais, o que o levou a filiar-se a um partido ligado à classe operária. Líder sindical, agora filiado a um partido político, Nicolau, se acha fortalecido e com prestígio para ser candidato a prefeito de Remanso, onde residia desde criança e era por todos querido. Na feira-livre, nas ruas da cidade, onde fosse encontrado, era assediado por pais de estudantes que, o procuravam, querendo fazer “média” com o professor, a fim de que este ajudasse seus filhos, a maioria avessos aos estudos, a passarem de ano.

Não tardou para que, incentivado por amigos, o professor Nicolau se lançasse como pré-candidato a prefeito do município de Remanso. Dois anos antes das eleições, do ano de 2008,o seu comitê já estava funcionando.Falava-se que Nicolau obtivera o índice de 25% das intenções de votos numa pesquisa encomendada por um dos seus adversários. Nicolau do Estadual será a grande ‘zebra”!, diziam muitas pessoas. Foi feita uma bolsa de aposta na bodega deZé da Mula e, Nicolau foi o favorito.

Puro engano, o ingênuo Nicolau não sabia que numa eleição para o cargo majoritário municipal,é condição sinequa non, ser possuidor(a)além de uma beleza física baseada nos padrões europeus, o pertencimento a famílias tradicionais locais, ou seja, descender diretamente dos colonizadores; como classificou Pierre Bourdieu, poder simbólico; exige gastos milionários, a serem arrecadados com os chamados financiadores que, nada mais são do que investidores, empresários, dentre outros atores sociais locais que conseguiram acumular capital e podem com isso especular, aplicando/investindo dinheiro nas campanhas eleitorais e, caso seu candidato(a) saia vitorioso(a) das urnas, eles se tornam uma espécie de sócios do município, o que Raimundo Faoro classifica como patrimonialismo.Desconhecendo essas práticas, Nicolau vê seus correligionários debandarem-se, como verdadeiros trânsfugas profissionais. Resultado os índices caem a cada dia nas pesquisas eleitorais.

A ignorância, os vícios culturais, as necessidades financeiras da população, o colocava cada vez mais sem chance alguma. Houve até quem dissesse: “Candidato sem dinheiro, é candidato sem chance, votar em candidato sem chance é perigoso, pois além de perder o voto, pode custar um emprego, uma bolsa [de estudos] ou quem sabe um alvará [de construção]”. Vendo perdido, Nicolau, distribui 100 (cem) convites a seus maiores amigos, para comparecerem numa reunião, no Salão Paroquial. Compareceram além dos párias sociais, apenas dois dos seus amigos. Desespero total. Equipe de campanha toda cooptada pelos adversários, sem locutor, sem pintor, sem coordenador – um caos.

Dia das eleições, sem gana sequer para cadastrar veículos junto à Justiça Eleitoral, um verdadeiro fiasco. Nicolau aguarda em casa, através do rádio, o resultado do pleito eleitoral. Obteve apenas 3%dos votos válidos, exatos 396 votos. Começam os insultos aqueles que Nicolau, como salvacionista de plantão, um dia pensava em defender, agora o insultam nas ruas da cidade, vaiando-o e gritando: “Nicolau não sabe o que quer, perdeu a política, perdeu o dinheiro e perdeu a mulher”. No dia seguinte à eleição, Nicolau viu um trio elétrico parado em frente a sua casa, uma multidão dançando, uma bebedeira e cantoria e, para sua decepção, à frente da massa frívola e devassa, um irmão seu da Irmandade dos Perfeitos, que antes da campanha o havia prometido apoio, dançando ao som da música Devagar devagarinho (da autoria do Martinho da Vila), em quem irado Nicolau atirou um urinol cheio de dejetos, o que lhe rendeu prisão em flagrante delito, saindo do xadrez, graças à intervenção de um famoso advogado seu amigo.

Aparecem os primeiros sinais de depressão. Sua esposa o leva aoCentro de Atenção Psicossocial (Cras), onde é diagnosticado como esquizofrênico. É necessário requerer a sua interdição junto ao Poder Judiciário e sua esposa o faz. Não consegue mais trabalhar, a situação agrava-se e o Professor Nicolau é encaminhado ao Hospital Psiquiátrico Juliano Moreira na Capital do Estado, onde fica internado por cinco anos. De alta médica regressa a Remanso, onde encontra sua mulher “enxodosada” com seu melhor amigo.

Desesperado saí pelas ruas da cidade, onde num boteco no distante Bairro de Vila Matilde, encontra seus fiéis companheiros de campanha. Depois de” tomar todas”, Nicolau e seus companheiros, altas horas da madrugada, resolvem invadir a sede da prefeitura e instalarem o que Zé Barbicha, um antigo comunista, agora um ébrio, chama de Governo Popular Revolucionário. Resultado são presos e finalmente julgados: Pena máxima 30 anos de prisão para cada um, a serem cumpridos em regime fechado na Casa de Detenção da Mata Escura na Capital do Estado, onde se encontram até hoje. Assim, Professor Nicolau, Zé Barbicha,Tamborete, Jaburu, Zé do Outeiro eMagrelo, Nicolau faz da sua cela seu Gabinete de Prefeito e seus fiéis companheiros, seus secretários e assessores.

Bem que essa estória poderia ser baseada em fatos reais, entretanto, é uma obra de ficção. Porém devemos refletir: Se você não possui quem financie sua campanha, mesmo que tenha o prestígio social do Professor Nicolau, melhor aquietar-se, pois os gastos com o pleito eleitoral majoritário são milionários. Quanto custa os materiais de campanha, os famosos “santinhos”, bandeiras, carretas, comícios, carros-de-som, trios elétricos, comitês, cabos eleitorais, etc.? Pergunte a quem já foi candidato.

Há quem diga que numa campanha eleitoral, os candidatos doam de cigarros a absorventes. Uma conta milionária que mesmo que os eleitores não saibam e queiram dar uma de espertos, lesando candidatos, acaba saindo do bolso deles (eleitores). Acredito que todos sabem ou pelo menos deveriam saber que, parte significativa do dinheiro desviado pela corrupção, acaba financiando as milionárias campanhas eleitorais. Se você acha o eleitorado brasileiro honesto, é bom saber que candidatos fora desse ”esquema”, serão rejeitados pelo povo e terão o mesmo destino do professor Nicolau, pois candidato sem dinheiro é candidato sem chance e votar em candidato sem chance é perder o voto e possíveis vantagens pessoais, além do que, ninguém quer ser chamado por jacu.

Deixe uma resposta

Seu endereço de email não será publicado.