carlos-magno

Caminhar pela praia. A renda da areia intocada no dia ainda bem cedo. Tão delicada teia. A sensação dos pés na areia. Fina. Talco. Sair. Abrir o portão e o mar. O amigo mar. Passou a noite toda quebrando na praia. Uma canção de ninar às vezes brusca, mas uma canção de ninar à qual se acostuma. Um tão azul céu. As fagulhas do sol derretido. Prata. Ouro. O vento. A umidade que ele carrega de tão longe. De tão perto.

O povoado, ainda no despertar. Dois ou três pescadores. A rede. Uma esperança. Os pescadores nunca perdem a esperança. A rede. Lançam. Recolhem. Uma imitação da maré. Lançam. Recolhem. Maré. O cheiro do sal. Os pequenos barcos pesqueiros. Os motores. Longe. Gemem. Monótonos. A pesca. O trabalho.

Pela praia a caminhada. Os coqueiros. Os coqueiros de perto e os de lá. Depois das casas. Brilham as folhas. Dançam as folhas. Outros caminhadores. Despreocupados. Caminhar. O ar. A brisa. As mulheres. Cabelos na dança da brisa. As crianças. É a praia vazia de todo dia. Quando ficam só os moradores. Bom. Bonito de se ver. Conchas. Tão pouca gente. No inverno é a contemplação do mar cinza. Do céu cinza e de espumas na quebradura das águas. Há o gado solto. Tão bucólico que tudo se perde num cismar que dura tempo e tempo. Sem pressa. Sem pressa o ônibus com gente indo para Valença. Chegando de Valença. No inverno a vida segue. Em outro ritmo. Na praça. O pão quente. O leite. Os punhados de verduras. As crianças nas escolas. Algazarra de meninos. De meninas. Os homens conversam. As mulheres passam e vão e voltam. É para o posto de saúde. Levar filhos para a escola. Para algum afazer que parece, não pode esperar. Mas pode. Param e se abraçam. Conversam. Sorriem. Seguem. A igreja. O templo. A reza. A oração.  O povoado respira em si. No inverno ele é do nativo. No verão, é negócio. O turismo. Ganhar dinheiro que é bom. Muito bom.

Tanto e tanto essa praia está no peito. Parece enraizada. E está. O povoado. O povo. Guaibim.  A subida do Patipe. Terra colorida no corte da estrada. Verde. Dendê. Verde. O entroncamento. Adão e Eva. Valença. O Una. O atracadouro. A fábrica. A igreja no alto. O verde. Os vendedores de verdura. Frutas. Passa gente. Passa carro. Passa bicicleta, quanta bicicleta. Filas na Caixa. Filas na lotérica. O calçadão.  Passa o Una. Via líquida com barcos, ladeada por ruas e carros. Gente. O Sena é uma via líquida no meio das ruas de Paris. O Douro, uma via líquida margeada por avenidas no Porto. O Tejo, uma via líquida no meio de Lisboa. O Una é a via líquida de Valença, o que o torna um rio especial. Ele é o rio que corta Valença. O que é muito para qualquer rio.

Essa Bahia sozinha é um país.

 

 

 

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