Políticos, autoridades e representantes da sociedade civil organizada dialogaram em prol da preservação e manutenção do patrimônio cultural de município

Uma audiência pública realizada pela Câmara Municipal de Valença no dia 18 de março, com organização da sociedade civil, trouxe à tona a preocupação com os patrimônios materiais do município. Com o tema “Valença tem patrimônio”, o evento contou com a participação dos vereadores, universidades, estudantes, representantes da sociedade civil organizada, grupos culturais e autoridades no assunto. Um dos objetivos do evento foi a criação de um grupo de trabalho para revisar a legislação municipal (Lei 1.888/07) que trata sobre o tema.

A audiência foi aberta pelo presidente da Casa, o vereador Bertolino Júnior, que agradeceu a todos que abraçaram a causa. Bertolino convidou o conselheiro estadual de Cultura, ator e produtor cultural, Adriano Oliveira, para conduzir os diálogos.

Compuseram a mesa os professores Ivaldo (UNEB), Mateus (UNEB), Patrícia (IFBA), Celia Pedrosa (IF Baiano), Francisco Neto (FAESB/AVELA); a diretora do Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia – IPAC, Luciana Mandelli; o padre Marcos Reis, pároco da Igreja Mariz do Sagrado Coração de Jesus; o presidente da Associação Comercial e Empresarial de Valença e diretor executivo do Jornal Valença Agora, Vidalto Oiticica; a secretária municipal de Educação, Albete Freitas.

Também presentes à mesa os vereadores Cristiano Barbosa, Fabrício Lemos, Helton Brandão, Reginaldo Araújo e Ryan Costa, Valdir Silvestre.

O valenciano Elísio Paes Muniz foi convidado para uma fala inicial, momento em que o empresário pontuou três pilares que, de acordo com a sua visão, sustentam o comportamento da humanidade: “Deus, pátria e família”.

Em tom crítico e sinalizando sua opinião sobre o tema da audiência, o empresário foi categórico: “Valença destrói patrimônio”, opinou, citando ainda sua tristeza com as condições do prédio da Câmara (antiga casa de Bernadino de Sena Madureira), da Igreja Matriz e do prédio da antiga cadeia pública. Lamentou ainda a destruição de outros prédios históricos, a exemplo da casa em que morou o ex-prefeito Gentil Paraíso Martins.

Em seu pronunciamento, o historiador Ivaldo, professor da UNEB de Alagoinhas e especialista em patrimônio imaterial, falou de sua aproximação com Valença, que se deu ao se apaixonar pela arquitetura da cidade. “Nós não podemos entender o patrimônio pela perspectiva do juízo e do valor. Essa não é a melhor maneira. É preciso entender que o patrimônio só será patrimônio se assim for entendido pela sociedade como patrimônio”, considerou.

O especialista destacou a importância da legislação e de políticas públicas com mecanismos de proteção dos patrimônios, ressaltando ainda o potencial econômico do turismo histórico.

Representando o IFBA, a professora e geógrafa Patrícia enfatizou que, infelizmente, a sociedade percebe a ausência dos patrimônios, “mas não percebe, no dia a dia, a sua presença”. “A luta tem que começar no processo de chamar a comunidade para a presença deles. Infelizmente, a maioria da população só percebe quando eles estão no chão”, lamentou.

“Cuidar do nosso patrimônio é cuidar da nossa memória”, afirmou a professora, sugerindo a utilização de prédios históricos em espaços comerciais. “Um pedido: que a gente tente unir forças para trazer o patrimônio que está vivo numa função comercial que não custe a sua demolição”, concluiu.

A coordenadora administrativa do IF Baiano, professora Célia Pedrosa, também defendeu que é preciso fortalecer a participação popular no debate sobre patrimônio e aproveitar sua riqueza para gerar economia através do turismo. “As pessoas passam por aqui para ir para Morro de São Paulo, Boipeba, e não percebem toda essa beleza que é Valença e que isso pode gerar também recursos porque essa é uma vocação importante do município tanto no turismo ambiental quanto o turismo do seu patrimônio histórico”.

Direto geral da Faculdade Faesb, o professor e historiador Dr. Francisco Neto, construiu uma réplica da antiga casa de Bernadino de Sena Madureira, para sediar sua instituição de ensino superior. Participando da audiência, o professor e empresário comentou sobre a iniciativa. “Essa ideia começou por eu ser historiador e segundo por desejar que os empresários não derrubem os prédios históricos que comprem, mas sim os revitalizem e o mantenham para preservar nossa história, memória e identidade”, afirmou, compartilhando sua visão acerca da preservação do patrimônio material de Valença.

A diretora do IPAC, Luciana Mandelli, iniciou sua fala pontuando que estamos “num momento de reconstrução das políticas de Cultura nesse país”.

“Precisamos entender que patrimônio é memória, é história, mas é sobretudo, identidade”, definiu.

“Valença faz parte de um complexo histórico importante para a história do Brasil. Estamos falando sobre a matriz da estrutura econômica fundante no que existe de economia do Brasil, então, é importante recolocar Valença onde ela nasce. Ela nasce na ideia de recôncavo baiano. Essa identidade vai sendo perdida ao longo das décadas e dos séculos, pela forma como a ideia de patrimônio foi se constituindo no estado da Bahia”, afirmou Mandelli.

Luciana lembrou ainda que a Câmara Municipal de Valença, foi a primeira, no país, a criar uma política de destombamento de um patrimônio, ao destombar o prédio da antiga casa de Câmara e Cadeia. “Já há uma ação judicial cobrando que esse patrimônio seja repatrimonializado e esta Casa tem o papel de cumprir essa tarefa também”, informou.

A diretora do IPAC anunciou durante a audiência que o Instituto conseguiu compor o valor total necessário para fazer a licitação do projeto executivo e obras de restauro da Igreja Matriz de Valença. “O IPAC está muito atento à política de patrimônio nessa cidade e vai continuar muito ativo acompanhando todas as ações”, concluiu.

O vereador Fabrício Lemos, turismólogo de formação, cobrou a participação do procurador do município para falar a respeito do processo sobre o destombamento aprovado pela Câmara e citado pela diretora do IPAC, impetrado à gestão. Fabrício destacou que além de orçamento também é necessária vontade política para mudar a realidade dos patrimônios valencianos. “Parabenizo todos os envolvidos pela iniciativa desta audiência, importantíssimo esse plano de trabalho a ser feito para irmos para campo. Me coloco à disposição para contribuir para que as coisas possam avançar”, afirmou.

O Padre Marcos Reis defendeu a proteção dos patrimônios, fazendo a seguinte reflexão. “Foi necessário queimar as santíssimas imagens, as mais belas, que só tem aqui e em Minas Gerais, para que a gente acordasse que precisamos cuidar de um patrimônio belo que não é só religioso, é cultural, faz parte do povo desta terra. Eu gostaria que independentemente da profissão de fé, a gente pense nisso. Vamos cuidar do nosso patrimônio!”, apelou.

O secretário municipal de Cultura, Gugui Martinez, participando por videoconferência, registrou que “a preocupação com o patrimônio é coletiva”. “É preciso fazer uma sensibilização e renovar legislação. A Gestão municipal está à disposição para contribuir com esse processo, para fazer uma Valença com identidade, onde as pessoas sintam orgulho do nosso patrimônio material que é rico”, acrescentou.

Autora do artigo “A produção urbana da ruína: Formação e abandono do patrimônio histórico e cultural de Valença-Bahia”, publicado no livro “Território, Cultura e (Des)envolvimento no Baixo Sul da Bahia (2021), a escritora Celeste Martinez reforçou a necessidade de atualizar a legislação e mecanismos de proteção aos patrimônios. Em seu artigo Celeste catalogou os patrimônios existentes no município denunciando seus estados de conservação.

O jornalista e empresário Vidalto Oiticica chamou a atenção para a necessidade de entendimento da grandeza que é Valença e suas riquezas. “Quando a gente se depara com a complexidade da grandeza que é essa terra, aqui está faltando simplesmente a gente entender quem nós somos. O que nós percebemos aqui é uma falta de entendimento generalizada. Precisamos modificar na nossa cultura o estado quo do estado político que há nessa cidade”, provocou.

“Às vezes a gente não se debruça, não se doa para aquilo que tem que ser feito. É trabalhoso. No Jornal Valença Agora nós trabalhamos com a contribuição do desenvolvimento sustentável em Valença e na região porque acreditamos nesse patrimônio”, exclamou.

O Jornal Valença Agora é um dos grandes defensores da cultura e dos patrimônios valencianos, noticiando e educando por inúmeras vezes sobre as riquezas e potenciais do nosso município, inclusive com sugestões e orientações para um viver melhor e uma sociedade desenvolvida. Em seu pronunciamento, o diretor Vidalto Oiticica reforçou o conceito de roteiros turísticos na cidade, a parir dos seus patrimônios.

“Está faltando coração, ação, bom senso, seriedade na nossa população. Valença tem um patrimônio milionário, mas continuamos pensando que somos pobres, pequenos, uma cidade medíocre. Nós não somos medíocres, não somos pequenos e não somos pobres. Somos ricos, maravilhosos, temos um potencial fantástico, só não estamos sabendo ainda o que fazer com isso”, concluiu.

Uma comissão com 15 nomes representantes de diversos setores formaram uma comissão para as próximas ações em prol do patrimônio local.

 

 

 

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