Lixão de Valença continua impactando o meio ambiente e a sociedade Jornal Valença Agora 2 de outubro de 2023 Baixo Sul, Notícias Não existe ainda previsão para que o lixão situado no distrito do Orobó seja eliminado e a área degradada recuperada Um problema que iniciou há mais de 30 anos e até hoje perdura: a destinação dos resíduos sólidos produzidos pelos moradores de Valença. O município não trata corretamente seus resíduos, muito menos há coleta seletiva. O que existe é um lixão localizado no distrito do Orobó, que ano a ano vem acarretando danos ambientais incalculáveis, impactando consideravelmente o bem-estar da população, além de prejudicar a saúde e a qualidade de vida dos moradores locais. O lixão não impacta diretamente a população da sede do município que não transita na área e não vê a realidade do lixão produzido por ela mesma, e isso deve ser levado em consideração para entender o porquê de não existir um clamor social ou campanhas para que a situação seja resolvida com a urgência que ela exige. O lixão de Valença já contaminou o solo e o lençol freático em níveis que ainda não há estudos que o definam; invadiu as nascentes e o leito do Rio Pitanguinha. Uma imensidão de resíduos tomou conta da paisagem antes bela e preservada, e, não há, até o momento, nenhum plano visando a recuperação do meio ambiente impactado. Um avanço vem sendo executado desde agosto de 2022, trata-se do envio dos resíduos para uma usina em Santo Antônio de Jesus, fruto de um convênio realizado através da Prefeitura de Valença. De acordo com o secretário municipal do Meio Ambiente, Marcelo Borges, o convênio abrange o envio de 40 toneladas por mês. No entanto, a forma como esse envio vem sendo executado não sanou problemas seríssimos ocasionados pelo lixão, já que o local continua recebendo os dejetos, servindo como um ponto de transbordo: Os caminhões da coleta de resíduos fazem o recolhimento em todo o município e despejam no lixão. Os caminhões de envio recolhem o material e encaminham para SAJ. Essa dinâmica está proposta até que o aterro sanitário de Valença seja construído. Vista parcial do Lixão de Valença (Foto: Jornal Valença Agora) A quantidade de resíduos sem qualquer tipo de tratamento ou coleta seletiva nesse ponto de transbordo (lixão) é assustadora. E segue impactando o meio ambiente, a saúde e a qualidade de vida das pessoas. A quantidade de resíduos enviados para Santo Antônio é visivelmente incompatível com a quantidade de resíduos no local que os recebe. Não é possível saber a quantidade de lixo produzida pelo município devido a não pesagem do mesmo, informou o secretário Marcelo Borges, em entrevista ao JVA. A vista do lixão de Valença é desoladora. Pessoas dividem espaço com urubus em busca de sobrevivência a partir do que podem encontrar nos rejeitos. O cheiro no ar é para os fortes. Os resíduos se espalham pela estreita estrada de terra prejudicando os transeuntes. No último dia 9 de setembro, um ônibus trazendo moradores do Orobó para o centro da cidade, deslizou em cima dos dejetos e atolou. Quando chove forte, a via fica intransitável. Ou seja, o lixão segue apresentando sérios riscos para o meio ambiente e para a saúde dos moradores do entorno, o que impacta a todos nós. Não há dúvida quanto a urgência de solucionar a destinação e tratamento dos resíduos produzidos por Valença. Mas, infelizmente, os trâmites burocráticos e interesses (ou desinteresses) políticos vem se arrastando ao longo dos anos. TRATATIVAS Em junho do ano passado, o governo federal se aproximou do município para discutir a questão dos resíduos sólidos. No dia 13, o secretário nacional de Saneamento do Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR), Pedro Maranhão, visitou a cidade e conheceu de perto o horror do lixão valenciano. A iniciativa faz parte da meta do Governo Federal de fechar cerca de 3 mil lixões a céu aberto existentes no país até 2033, em atendimento ao Novo Marco Legal do Saneamento Básico (Lei n° 14.026). O secretário Pedro Maranhão retornou a Valença no dia 8 de setembro do mesmo ano para assinar junto ao município um termo de compromisso para encerramento do lixão existente no Orobó e estudos para o seu fechamento. O documento assinado entre governo federal e municipal previa ainda a implantação de ações previstas no plano de trabalho elaborado dentro do prazo acordado, o auxílio na contrapartida por meio de disponibilidade de técnicos, equipamentos e maquinários, implantação da coleta seletiva, e, se caso necessário, contratação de disposição final dos resíduos sólidos em aterro sanitário, além da divulgação das atividades e repercussões. O estudo ficou com a responsabilidade da orientação do Ministério do Desenvolvimento Regional, através da Secretaria Nacional de Saneamento e da Prefeitura Municipal de Valença. O JVA não conseguiu informações a respeito do andamento do estudo e execução das ações definidas do termo. Matéria do Governo Federal publicada em setembro de 2022, afirmava que o município avançaria para as próximas etapas, “que abrangem consultoria para avaliar a situação dos locais, a elaboração de estudos de gaseificação e contaminação da área degradada e a posterior recuperação ambiental.” “O MDR conta com apoio de equipes técnicas para dar suporte a ações de gestão de resíduos, coleta seletiva, mobilização da população e inclusão e capacitação dos catadores que trabalham nos lixões in loco. Há uma grande concentração de lixões a céu aberto na faixa litorânea brasileira, principalmente na Mata Atlântica. Com esse projeto, estamos avançando na despoluição do mar dessas regiões. Os lixões serão substituídos por aterros ambientalmente corretos, com transbordo e separação dos resíduos", destacou o secretário nacional de Saneamento do MDR, Pedro Maranhão, na ocasião. Além de Valença, em 2022, o MDR também fechou acordos com outros municípios baianos: Cairu, Ilhéus, Senhor do Bonfim e com o Consórcio de Desenvolvimento Sustentável do Piemonte Norte do Itapicuru (CDS TIPNI), que abrange outros nove municípios. Com a medida, os entes se comprometeram, a encerrar seus lixões. Em dezembro de 2022, aconteceu em Valença, o Lançamento do Fórum Pelo Fim dos Lixões no Brasil, uma parceria entre a Secretaria Municipal de Meio Ambiente de Valença com as diversas prefeituras e entidades da Bahia e do Brasil. O Fórum é um espaço de discussão, proposição e troca de experiências para gestão de resíduos sólidos e erradicação dos lixões. Tem como presidente nacional o secretário de Meio Ambiente de Valença, Marcelo Borges. A posse ocorreu em janeiro deste ano, em Salvador. “A proposta do Fórum para 2023 será a realização de encontros nos municípios do Brasil. Um calendário de atividades e eventos será montado, inclusive com agendas de trabalho com a nova equipe do governo federal e do governo do estado para buscar por novas tecnologias e parceria com o setor privado para seguir a agenda do fim dos Lixões”, afirmou, à época, Marcelo Borges. NOVO MARCO LEGAL DO SANEAMENTO O Novo Marco Legal do Saneamento (Lei nº. 14.026/20), que prevê o fechamento de mais de 3 mil locais de disposição final inadequada de resíduos sólidos espalhados por todo o País. O de Itacaré-BA é o primeiro lixão na Mata Atlântica a ser encerrado desde a sanção da lei. O principal objetivo da legislação é estabelecer novas alternativas de financiamento e mecanismos para universalizar os serviços de saneamento básico no País até 2033. A meta é 99% da população com acesso a abastecimento de água e 90%, a coleta e tratamento de esgoto. GESTÃO REGIONAL DOS RESÍDUOS SÓLIDOS No dia 14 de julho de 2021, o Consórcio Intermunicipal das Apas do Baixo Sul - Ciapra, formado pelos 15 municípios do Baixo Sul, sendo eles, por ordem alfabética, Aratuípe, Camamu, Cairu, Gandu, Ibirapitanga, Igrapiúna, Ituberá, Jaguaripe, Nilo Peçanha, Piraí do Norte, Presidente Tancredo Neves, Taperoá, Teolândia, Valença e Wenceslau Guimarães, realizou em Valença, uma assembleia com o painel "Território do Baixo Sul e as Políticas de Coletas, Transporte e Destinação Final do Resíduo Sólido". O encontro realizado no auditório da Casa do Empresário de Valença contou com a participação do então secretário de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia - SEDUR, Nelson Pelegrino; do superintendente de Planejamento e Gestão Territorial da SEDUR, Armindo Gonzalez e de representantes do Grupo Torre, empresa interessada na gestão dos resíduos sólidos. Na ocasião, o presidente do Ciapra e prefeito de Gandu, Leonardo Barbosa, ressaltou que o modelo consorciado de gestão tem sido o caminho para soluções dos problemas comuns aos municípios da região. O titular da SEDUR, Nelson Pelerino, comentou durante o encontro de 2021 sobre a proposta do Estado em apoiar os municípios na solução da destinação ambientalmente correta dos resíduos sólidos. “A Lei do Marco do Saneamento estabeleceu que todos os municípios têm que resolver o problema do lixão até 31 de dezembro de 2020, há seis meses atrás e, a partir daí todos os municípios que não se adequaram a Lei estão lidando com mora ambiental e seus gestores podem ser responsabilizados. O governador Rui Costa me pediu que desse prioridade a esta questão, então nós montamos uma estratégia, discutimos com os prefeitos em 2020, infelizmente a pandemia retardou um pouco, mas continuamos com esta missão”, afirmou. Resíduos, por vezes, invade a estreita estrada de terra. Quando chove, a situação fica ainda mais perigosa. (Foto: Valença Agora) “A Lei estabelece que a regionalização é obrigatória, ou seja, é preciso que os municípios se juntem para enfrentar o problema porque individualmente eles não têm condição de enfrentar, e a gente precisa encontrar uma estratégia que não seja apenas pegar o lixo e jogar num aterro, a gente precisa estabelecer a educação ambiental, a coleta seletiva, resolver o problema dos catadores e reciclar, porque o lixo reciclado gera receita. A Lei também estabelece que a sociedade - aqueles que produzem o lixo - tem que pagar pela destinação final, então há obrigatoriedade de estabelecer uma taxa ou uma tarifa, então a partir de hoje a gente está dando um passo mais adiante, que é encontrar uma solução consorciada para que possamos fazer a coleta e uma destinação corretamente e ambientalmente como estabelece a Lei”, destacou o secretário. Ainda nesta reunião, o Gerente Executivo de Planejamento Financeiro e Estratégico da Torre Empreendimentos, Igor Torres, apresentou ao Ciapra uma proposta de gerenciamento de resíduos sólidos. “Entregamos hoje em Valença para o Ciapra, a nossa manifestação de interesse, enquanto ente privado, de uma solução integrada, uma central de tratamento de resíduos, não só domiciliares, como da construção civil e também de saúde. A gente acredita que essa central vem para atender a curto prazo, todas as políticas de resíduos do marco do saneamento, através da divisão do ônus, de maneira igualitária e proporcional, com os entes produtores de resíduos através de uma tarifa ou taxa conforme preconiza a Lei”, afirmou Igor. O projeto da Torre Empreendimentos, denominado Parque do Sol, também foi apresentado em Valença, durante o lançamento do Fórum pelo Fim dos Lixões. O município, considerado a capital do Baixo Sul é o então “escolhido” para sediar o projeto do aterro sanitário regional. Para que o projeto tenha encaminhamento, todas os municípios consorciados precisam aprovar uma lei que autorize o poder executivo municipal a delegar, pelo regime de concessão, a execução dos serviços públicos de saneamento básico conceituados no art. 3º, i, da lei federal nº 11.445/2007. Em Valença, o PL também promove a cessão onerosa de uso de terreno público ao Ciapra para fins de implementação do projeto de concessão dos serviços públicos de manejo de resíduos sólidos, no âmbito dos municípios integrantes do aludido consórcio público. Em entrevista para o JVA, o secretário de Meio Ambiente de Valença, Marcelo Borges, informou que o projeto (PL nº 012/2023) já chegou à Câmara de Vereadores do município para apreciação e votação. Borges disse que dos 15 municípios consorciados, 13 já aprovaram a lei, faltando a aprovação dos municípios de Cairu e Valença. No último dia 11 de setembro, a Câmara Municipal de Valença realizou uma reunião com a presença de sua assessoria jurídica e representantes do Conselho Municipal do Meio Ambiente – CODEMA para entender e tirar dúvidas sobre o projeto de lei. Em entrevista ao Jornal Valença Agora, o presidente do CODEMA, Luiz Vitor Marsala, compartilhou que durante a reunião na Câmara se posicionou em defesa da aprovação da Lei Municipal de Saneamento Básico para que Valença possa ser a sede do aterro regional. “Eu mesmo participei dessa lei de saneamento básico. Ela já tramitou na Câmara, voltou para o Executivo uma ou duas vezes. Da última vez, a municipalidade convocou o CODEMA para participar do refinamento da lei. Então, isso foi praticamente até o final, faltando um detalhe que, na minha opinião, é muito importante. E por isso que essa lei está guardada até agora. Não sei se alguém resolveu botar para andar, mas, até agora, não tenho notícia desse andamento”, afirmou Luiz Vitor. Ainda segundo o presidente do CODEMA, citando o Novo Marco do Saneamento., os municípios necessitam ter uma agência regulatória própria. “Um órgão independente, cujos componentes têm um mandato e que existe para fiscalizar o cumprimento das regras, da legislação pertinente ao saneamento básico do município, entre outras coisas, o aterro sanitário”, explicou Luiz Vitor indicando que, no caso da regionalização, a agência regulatória seria do Ciapra, o que segundo a sua avaliação, prejudicaria o município de Valença, já que os outros municípios enviariam seus resíduos e não seriam fiscalizados já que que o aterro funcionaria em Valença. “Seriam 14 municípios conta 1”, pontuou o representante do CODEMA, defendendo que Valença também possua sua agência regulatória própria. Luiz Vitor falou ainda que “não adianta nada ter uma agência regulatória sem ter uma lei para respeitar”, referindo-se à inexistência da Lei Municipal de Saneamento Básico. Segundo ele, o assessor jurídico da Câmara concordou com os argumentos apresentados pelo CODEMA. “Valença tem uma população razoável e é bem possível que, se não participar do consórcio para regionalização dos resíduos sólidos e se houver a criação de uma cooperativa que possa fazer o recolhimento, a gerência e a organização de um aterro sanitário, com uma assessoria especializada, eu acho que a gente teria como ter um resultado econômico-financeiro interessante sem precisar participar de consórcio nenhum”, acredita Luiz Vitor. Lixão de Valença, localizado no Orobó, zona rural do município (Foto: Valença Agora) O destino dos resíduos sólidos de Valença ainda é incerto e enfrentará muita burocracia, pelas informações obtidas até aqui. Enquanto isso o povo continua sofrendo as consequências da ausência de políticas públicas eficazes, da omissão dos governos ao longo dos anos e da leniência da própria sociedade. O JVA está buscando mais informações e acompanhará o processo da Lei que tramita na Câmara Municipal e os passos seguintes, sendo ela aprovada ou não. Deixe uma resposta Cancelar resposta Seu endereço de email não será publicado.ComentarNome* Email* Website