Quanto se inventou a palavra cafona Valença Agora 16 de janeiro de 2017 Colunistas, Matutando Conforme o clássico Dicionário Aurélio, 2004, p. 359, diz-se cafona a pessoa que, com aparência ou pretensão de elegância, foge ao que convencionalmente é de bom gosto. Para alguns, a referida palavra deriva do latim cafo, nome de um centurião romano de hábitos grosseiros. Na década de 1970, o autor deste texto residia na Fazenda Velha, naquela ocasião estava em moda a palavra cafona e seus derivados, cafonice, quadrado, careta e assim por diante. Dessa forma, era considerado cafona quem, por exemplo continuasse a criar suas galinhas nos vastos quintais das antigas casas da vila, o que era um hábito cultivado por gerações, agora considerado cafona e quem assim procedesse sofria, o que nos dias atuais se convencionou chamar de bullying. (num estrangeirismo ridículo, de um país que teima em ser colonizado, americanizaram até a palavra gozação, sarro, etc.) Agora para estar-se na moda, na crista da onda como se dizia naquela época, dever-se-ia dar fim nas galinhas que se criavam nos quintais e comprar um “galeto” (entupido de hormônios e substâncias nocivas à saúde humana), no supermercado que surgia o primeiro comércio de tal gênero na cidade. Os peixes pescados por Sr. Barachísio, antigo pescador da localidade, dantes saborosos e pescados no estuário do Rio Serinhaém, agora não serviam mais, o chic era comprar pampos, enchovas e similares com conservantes e congelados, numa peixaria que se abrira na Cidade, cujo proprietário, ia numa Kombi vender na Fazenda Velha e adjacências. Além dos gêneros alimentícios, outros costumes começaram a mudar de forma radical. Naqueles tempos surgiram as famosas calças de nycron. O pai do autor deste texto, a exemplo disso, certa feita foi censurado por alguns da membros da comunidade, pois ao invés de comprar uma calça para seu filho confeccionada com o mencionado tecido, comprou uma novilha: “como pode uma pessoa com condição não comprar uma calça de nycron para o filho? Exclamou uma notável senhora naquela época. Depois vieram o tergal verão, as calças “boca de sino”. As costureiras, dantes chamadas de modistas, os alfaiates, senhoras e senhores afamados, muito embora secularmente existentes, de imediato saíram de cena, pois para não ser cafona, o sujeito deveria comprar roupas prontas nas lojas da cidade, fazendo com que D. Joana, antiga costureira aposentasse sua antiga máquina de mão e os alfaiates famosos da cidade mudassem de profissão. Até a forma de lavar roupas mudou. Na famosa e inesquecível fonte da Fazenda Velha, onde senhoras e moças lavavam roupas com sabão em massa, aproveitando a água e as pedras do rio de Itajaí, agora quem não lavasse com sabão em pó e água sanitária de uma conhecida marca seria considerada uma cafona. Os jovens não podiam cortar seus cabelos, pois a moda agora era cabelo “ouriçado”, imitando artistas e jogadores de futebol, utilizavam-se os famosos “pentes para ouriçar ou ripar”, confeccionados com raios de bicicletas e um cabo em madeira. É bom salientar que ditas mudanças na Fazenda Velha, coincidência ou não, começaram quando lá entrou o primeiro aparelho de TV, comprado por Pedro de Roque, no ano de 1968, logo depois, Roque adquiriu o seu aparelho televisivo, seguido por Antônio de Cabocla, Antônio Severo, Gibira, Naído e outros. À noite a rapaziada, a moçada e até algumas senhoras enchiam as salas das casas vizinhas para assistirem as famosas novelas, a exemplo de “Uma Rosa com Amor”, “Cavalo de Aço”, “Pai herói”, esta última, com André e Karina (Tony Ramos e Elizabeth Savalla). No dia seguinte na fonte as mulheres só comentavam sobre os beijos e as peripécias de André e Karina. Assim, cada rapaz se achava um André, da mesma forma, cada moça se achava uma Karina, incorporando os costumes desses e de tantos outros personagens .Antes da chegada da TV, reuníamo-nos sentados em esteiras de tabus, confeccionadas por dona “Maria do Veinho”, nas antigas calçadas de pedra na frente da casa de D. Gregória, onde ouvíamos atentamente a própria dona da casa e minha avó, D. Maria a contarem estórias para a meninada que as ouvia atentamente. Outra diversão, eram as brincadeiras de “percula” (picula) e “cabana” para os meninos e as cantigas de roda para as meninas. Tudo acabou com a chegada do primeiro aparelho de televisão. Passamos a ser teleguiados, como certo dia disse acertadamente, o obreiro Sr. Antônio Reis: “não é televisão, é tira visão”. A verdade é que o sujeito tinha duas opções, ou se enquadrava no novo sistema, ou sofria as humilhações de ser considerado um cafona, como ninguém gosta de ser humilhado, mesmo resistindo por algum tempo, o indivíduo acabava cedendo e deixava a cafonice de lado. A palavra cafona, aliada à TV, mudou de forma radical a Fazenda Velha de outrora. Creio que não foi um fato isolado que a televisão continua a influenciar de forma negativa o povo, transformando-o em massa, influindo sobremaneira nos costumes, transformando-os em consumidores vorazes, o que em muito contribui para a dominação, mantendo no poder a classe dominante que é a mesma classe dirigente. *Publicado na edição impressa nº 601, do jornal Valença Agora. 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