Pouca divulgação faz com que o valenciano guarde apenas os casos mais dramáticos

Quatro e meia da tarde. Uma senhora de 57 anos, valenciana da gema, se prepara para passar o feriado da Páscoa em um pequeno sítio que tem para os lados da Aldeia de São Fidélis. Na estrada para Gereba, vê alguns carros parados na frente. Estava em uma carona bem-vinda, que a deixaria na porta de sua casa, na zona rural de Valença.

Rapidamente ela percebeu que era um assalto. Dois motoqueiros apontavam armas para os passageiros do carro da frente. Em questão de segundos, um outro já encostava um cano de revólver na sua garganta. “Pareciam trabalhadores, gente jovem, sujos de terra, mas eram assaltantes”, disse EMJ, funcionária pública da área da Saúde, que tem no sítio o seu refúgio para o descanso.

Aos poucos, ela vai aumentando sua casinha de campo, cuidando das árvores, plantando uma horta. “Me levaram o dinheiro e o celular, fiquei morrendo de medo, não consegui nem dormir na primeira noite”, complementa.

O que era para ser uma busca pela paz e descanso virou um pesadelo. Ficou de quinta à noite a sábado pela manhã sem nenhuma comida, com as portas de sua pequena chácara trancadas. Só no sábado de Aleluia ela conseguiu por os pés para fora, dar um olá para seus vizinhos e pedir ajuda.

Fatos como este são frequentes na pacata área rural de Valença. Não é a primeira vez que ocorre um crime naquela região. Há dois anos, um pequeno agricultor de cravos da índia morreu baleado, quando os assaltantes lhe levaram a carga e o carro. Levou um tiro, foi para o hospital e não resistiu.

No início do ano, uma funcionária do Banco do Brasil, recém-transferida de Belo Horizonte para Valença, chegou em casa às nove da noite. Calmamente foi abrir o portão da garagem. Em questão de segundos, um motoqueiro chegou com arma em punho, levou celular e dinheiro. Seu apartamento fica a um quarteirão da Praça da República, bem no centro da cidade. “Eu não sabia que era arriscado sair à noite em Valença, me mudei pra cá justamente por ser uma cidade do interior”, diz a funcionária. Pelo menos, ela registrou um boletim de ocorrência na polícia militar e, no dia seguinte, o motoqueiro assaltante foi preso.

Um outro caso ainda é lembrado pela sociedade valenciana. Um funcionário de banco denunciou o ladrão que roubou sua filha. O ladrão foi preso. Quando saiu da cadeia, resolveu acertar as contas com o funcionário, que acabou perdendo a vida.

 

Maus hábitos

Infelizmente, não são todos que agem como a funcionária do Banco do Brasil ou como o funcionário morto pelo assaltante de sua filha. Em ambos os casos, a violência mostra suas garras, deixando para a população uma marca da ineficiência do poder público em questão de segurança. Tanto é que, no caso do pequeno “arrastão” ocorrido antes da Páscoa na Aldeia de São Fidélis, nenhum dos assaltados registrou ocorrência. Ou seja, o que era fato passou a ser apenas história contada à boca pequena.

O sociólogo Sérgio Herrera, há mais de 20 anos dando aulas na Universidade do Estado da Bahia (Uneb), campus de Valença, explica que a violência não é exclusividade de um ou outro fator. “Somos todos responsáveis: nós como eleitores e o poder público municipal, estadual e nacional como executores de obras sociais”, afirma em conversa com o JVA.

Para ele, os cidadãos são responsáveis à medida que não cobram das autoridades as melhorias na qualidade de vida, tanto na questão de segurança, como também em transporte, iluminação, ruas asfaltadas, água e esgoto. “O brasileiro em geral desacreditou do poder público, por isso, quando é assaltado por pouca coisa, acaba deixando o fato de lado e seguindo a vida”, arremata.

O principal entrave, no entanto, está nos elementos jurídicos, ou seja, nas leis que poderiam ser mais eficazes, garantindo uma tranquilidade maior à população brasileira. No caso de Valença, Herrera agradece aos manguezais que circundam a cidade, fonte de alimento e renda para muitos. “Seríamos bem mais pobres se não tivéssemos essa fonte de alimento”, complementa.

 

Memória coletiva

O que a população valenciana não sabe ainda é o tamanho do trabalho que vem sendo feito pelas polícias militar, civil e municipal. Os índices de criminalidade têm caído vertiginosamente. Dados da Polícia Civil registram uma queda de 20% de roubos – assaltos utilizando armas – de 2019 para 2020, e de quase 16% nos três primeiros meses de 2021, em relação ao ano passado.

Nesta semana, uma dupla de assaltantes foi presa próximo à localidade de Jequiriçá. “Eles podem estar envolvidos no caso do arrastão ocorrido na zona rural antes da Páscoa”, desconfia a delegada titular de Valença, Argimária Soares, há um ano no cargo.

Delegada titular de Valença, Argimária Soares

Em entrevista exclusiva ao JVA, a delegada mencionou que o trabalho é grande para pouco efetivo e parcos recursos. Mesmo assim, tem gerado resultados positivos. “O grande problema é que não temos tempo para divulgar nossas ações, tamanha a demanda, e mostrar à população que o poder público está agindo na questão da segurança em Valença”, alega, relacionando a dificuldade com a memória coletiva que o povo ainda tem de Valença.

Major Bruno Czekus, comandante da 33ª CIPM

A redução da criminalidade no município também é confirmada pelo major Bruno Czekus, comandante da 33ª. Companhia Independente da Polícia Militar de Valença (CIPM). Segundo ele, mesmo com as dificuldades de pessoal e com a contaminação de alguns policiais pela Covid-19, houve uma redução de um terço dos homicídios no primeiro trimestre deste ano, se comparado ao mesmo período do ano passado. “Só em março, a redução foi de 60%, em relação a março de 2020”, enfatiza.

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Em nota oficial da polícia militar, o major informa que o trabalho tem sido intenso e rigoroso: “A 33ª CIPM realizou ainda nos últimos meses a condução de 143 pessoas para delegacia, sendo lavrados 38 flagrantes, além de apreensões de drogas como maconha, crack e cocaína. Nos três primeiros meses do ano foram recuperados 11 veículos (furtados e roubados) dentro e fora da região. O comando da unidade segue comprometido com a ordem social, realizando reforço do policiamento e operações para combater ações criminosas, além de se colocar à disposição para receber a comunidade e realizar um trabalho cada vez mais eficaz”, conclui a nota.

 

Comprometimento municipal

 A garantia da segurança da população de Valença ainda tem o reforço da guarda municipal. Com 95 homens, sendo apenas um terço deles bem treinados e capacitados, o efetivo já está intensificando o monitoramento de casos no Orobó, Gereba e Jequiriçá. “O novo prefeito Jairo Baptista tem ampliado os esforços para melhorar nossa capacitação, com mais treinamento, além de armamentos e veículos”, ressalta o diretor da guarda municipal, Manoel de Jesus.

Manoel de Jesus, diretor da Guarda Civil de Valença

No projeto de melhorias, o diretor cita a licitação para a compra de mais quatro veículos – sendo dois com tração dupla, para a área rural - duas motocicletas e mais 20 armas de grosso calibre. “São três mil quilômetros quadrados a serem fiscalizados”, lembra o diretor, citando o tamanho da área rural de Valença. “Queremos estar no local para evitar que os crimes aconteçam”, completa.

 

Foto em destaque: Rafael Freitas Reale/Reproduzida da Internet

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