Por Prof. Francisco  Neto | Investigador de Polícia Classe Esp. - IPC Polícia Civil da Bahia, Especialista em Gestão em Segurança Pública e Ordem Pública, Especialista em Criminologia e Doutor em Direito.

Com o avançar da tecnologia e da globalização, a humanidade tem passado por constantes transformações, sobretudo no que diz respeito à tecnologia nas últimas décadas, principalmente Pós Pandemia. Incentivado pela rapidez e facilidade de envio e recebimento de informações telemáticas, o Ser Humano e a máquina, tal como “Criador e Criatura”, estão cada vez mais sintonizados.

Com tais avanços tecnológicos, infelizmente também avançam as modalidades de crimes cibernéticos, ou como atualmente ficaram conhecidos por Cybercrimes, onde passou a cada vez mais a fazer parte do cotidiano das pessoas.

São muitos os conceitos de Crime cibernéticos, mas aqui escolhemos o que prega que:  [1]são atividades criminosa que tem como alvo , através do uso  de um computador ou celulares, integrados a uma rede de computadores ou um dispositivo conectado em rede cometem crimes através de golpes e indução a erro pessoas que navegam no sistema mundial de Internet. Esse crimes cibernéticos são cometidos por cibercriminosos ou hackers que querem auferir vantagem devida sobre suas vítimas. Tais crimes são realizados em escala global, prejudicando pessoas, empresas e governos, sendo por esse motivo a dificuldade de apura-los.

A responsabilização criminal dessa modalidade de crime é um tema deveras complexo que oscila levando em consideração cada legislação dos países.

Nos Estados Unidos, a lei federal é a  fonte precípua de legislação que se refere aos crimes cibernéticos; No Reino Unido, a lei de uso Indevido de Computadores (Computer Misuse Act) é a Norma jurídica  relacionada a crimes cibernéticos, tal lei prevê a punição para quem acessa um sistema de computador sem autorização,  para  quem causa danos a um  determinado sistema de computador; Na Alemanha, existe a lei que prevê a responsabilidade penal para os crimes cibernéticos no Código Penal que   prevê a punição para quem obtém ou tenta obter acesso indevido a dados eletrônicos, ou quem danifica ou impede o funcionamento de sistemas de computação, onde a pena pode chegar até dois anos de prisão. Na França a legislação tem características do sistema processual acusatório e inquisitivo, onde dependendo da gravidade do delito em questão, o Juiz poderá participar mais ativamente no que tange à fiscalização, bem como a polícia pode dar as cartas na investigação.

A Carta Magna Brasileira apesar de temas ainda tão atuais, não acompanhou o processo de atualização desse Mundo digital e consequentemente, seus crimes. Visto que, por mais que se tenha dispositivos legais que mencionem a garantia da segurança das informações, eles são insuficientes para resolver a grande demanda de diversas ameaças que circundam os usuários da rede mundial a toda hora, todos os dias e atualizam-se constantemente, indo de encontro ao Direito que, infelizmente caminha a passos curtos, porém contínuos. Contudo se faz necessário ressaltar que o nosso Código Penal, é datado da década de 1940, onde os meios de comunicações da época eram o jornal e a tecnologia mais avançada era o rádio e em 1950 a implantação da Televisão que dava seus primeiros passos, sendo explicito que as leis pátrias não acompanharam o processo de evolução da tecnologia.

Um grande avanço que houve nessa área foi no inicio da década dos anos dois mil, acontecendo a Convenção de Cibercrimes, sendo criada, mais precisamente no ano de 2001 na Hungria, através do Conselho da Europa, a Convenção sobre o Cibercrimes ou como a Convenção de Budapeste, englobando mais de vinte países tipificando os principais crimes cometidos na Internet e estando em vigor desde meados de 2004, após ser ratificada por cinco países. A  Convenção de Budapeste ganhou um  texto de quatro capítulos com titulação de: Terminologia, Medidas a Tomar a Nível Nacional, Cooperação Internacional e Disposições Finais, respectivamente, distribuídos  em cerca quarenta e oito artigos, com a finalidade sumária que  exalta o respeito à [2]Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais do Conselho da Europa ; ao Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos da ONU ; à Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança ; e à Convenção da Organização Internacional do Trabalho sobre as Piores Formas do Trabalho Infantil. Desta forma, o tratado define os cibercrimes, cominando sua conduta, como infrações contra sistemas e dados informáticos, infrações relacionadas com computadores, infrações relacionadas com o conteúdo, pornográfico infantil e infrações relacionadas com a violação de direitos autorais.

No Brasil existe também uma cominação legal que prelata a punição para crimes cibernéticos. O Código Penal Brasileiro prevê punição para quem realiza invasões de dispositivos eletrônicos, previstos no artigo. 154-A do Código Penal Brasileiro ou para quem pratica crimes contra a honra de outrem por meio da internet, e o artigo . 139, parágrafo 2º do mesmo código.

Foi ainda criada uma legislação de número 12.737/2012, que acabou ganhando o apelido de “Lei Carolina Dieckmann”, nome da atriz da Rede Globo de Televisão que foi vítima de invasão de computador, onde imagens contidas em seu aparelho foram utilizadas como meio de extorsão e posteriormente divulgadas, e tal episódio acelerou o andamento de projetos que já tramitavam com o fim de regulamentar essas práticas delitivas cometidas em meios informáticos para modernização do Código Penal Brasileiro.

A lei prevê a punição para crimes cibernéticos que envolvem a violação de dispositivos eletrônicos e trouxe como inovação na Norma jurídica o crime de “Invasão de Dispositivo Informático”, que torna crime a conduta de invadir dispositivo informático alheio com o intuito de obter vantagem ilícita.

Devemos lembrar que a Lei Carolina Dieckmann completou onze anos no fim de 2023. E a mesma foi alterada pela Lei 14.155/2021 que alterando o Artigo 154-A do Código Penal Brasileiro determina, como crime de invasão de dispositivo computacional mesmo que esteja ou não ligado na rede de computadores.

"Art. 154- A. Invadir dispositivo informático de uso alheio, conectado ou não à rede de computadores, com o fim de obter, adulterar ou destruir dados ou informações sem autorização expressa ou tácita do usuário do dispositivo ou de instalar vulnerabilidades para obter vantagem ilícita: Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa".

Assim sendo, a invasão de dispositivo informático recebeu um aumento de pena, com uma agravante em caso de causar prejuízo. Sendo assim, quando um computador é invadido e se obtém senhas e prejuízos são causados, a pena pode aumentar em até dois terços, podendo chegar até sete anos de prisão.

Houve também uma mudança, onde ressalta a falta de necessidade de violação de dispositivo de segurança, pois na redação anterior, o indivíduo podia invadir o dispositivo, se não tivesse violado mecanismos de segurança não haveria crime. Desta forma, ainda, que o hacker invadisse o computador e tivesse acesso as informações apenas, não cometeria crime algum. Contudo com a mudança da redação, ocasionou uma mudança relevante. Nesse caso tornou-se crime de consumação antecipada, visto que a simples invasão, já é considerada crime, independente de violação de mecanismos de segurança.

A mudança na legislação trouxe, novos parágrafos também ao Artigo 155 do Código Penal que se refere ao crime de furto, onde o Poder Legislativo Federal quis punir os crimes cometidos por meio da internet. A pena aplicada àquele que invade dispositivo computacional e furta informações pode pegar até oito anos de prisão sem as agravantes genéricas, que no caso de utilização de servidores fora do país pode levar o aumento para até doze anos de prisão, e se praticado contra idoso aumenta-se a pena para dezesseis anos de prisão.

O legislador ainda incluiu outros parágrafos ao crime de Estelionato cominado no Artigo 171 do Código Penal Brasileiro, criando assim o crime denominado de "fraude eletrônica", onde o indivíduo comete o crime com a utilização de informações fornecidas pela própria vítima ou por terceiro, com o induzimento a erro por meio das redes sociais, contatos telefônicos ou pelo correio eletrônico fraudulento, ou outro meio análogo.

Com tais inovação, poderão assim ser punidos todos os crimes cometidos por meio de sites de compra e venda de produtos, onde a punição pode alcançar até a oito anos de reclusão. Essa clausula agravante pode elevar a pena até doze anos de prisão sendo aplicada quando o crime for cometido fora do Brasil.

Não esqueçamos do stalking que encontra-se cominada também na Lei 14.132/2021. O crime de stalking é definido como perseguição reiterada, por qualquer meio, como a internet (cyberstalking), que ameaça a integridade física e psicológica de alguém, interferindo na liberdade e na privacidade da vítima. Anteriormente, a prática dessa conduta era enquadrada apenas como o crime “anão” contravenção penal do artigo 65 da LCP, que previa o crime de perturbação da tranquilidade alheia, punível com prisão de 15 dias a 2 meses e multa, sendo inexequível.

Com isso, o crime de perseguição teve a pena aumentada em 50% quando praticado contra criança, adolescente, idoso ou contra mulher por razões de gênero. O acréscimo na punição também é previsto no caso do uso de armas ou da participação de duas ou mais pessoas.

Peço exposto é cediço que as inovações da lei não possui o condão de extinguir os crimes cometidos usando a rede mundial de computadores pelo fato do  rápido avanço tecnológico e social,  e dificuldade de identificação do local de onde se originou o golpe, devido a servidores em outros países e retransmissores de sinais espalhados em lugares longínquos em diversas partes do mundo, contudo  nesse diapasão, restou provado que os diversos desafios de aprimoramento  da legislação brasileira se faz necessário a observação dos crimes cometidos, realizando assim uma cuidadosa hermenêutica, levando em consideração o caso concreto e a sensibilidade por parte do legislador em adequar as Normas Jurídicas  já existentes e quando necessário a criação de novos institutos jurídicos, com o cuidado de não se  tornar uma legislação que censure publicações ou retire Direitos já arraigados na sociedade, pois não se pode jamais confundir institutos jurídicos com escopo de proteger as vitimas de crimes com a simples e mera censura.

Os cibercrimes mais cometidos em nosso país são justamente o Plágio, que consistem em crime de violação de Direito autoral, invasão de dispositivo informático telemático/furto de dados, que ocorre quando um aparelho e invadido, com o objetivo de obter, adulterar, destruir dados ou deixar as informação contidas nele vulneráveis, através de vírus e afins; Calúnia, Difamação e injuria já contida a décadas no código penal e adequada as crimes digitais; Incitação/Apologia ao crime, pornografia infantil, racismo/ LGBTfobia / Misoginia e suas variações; Pirataria digital, que se configura em copiar, reproduzir ou vender produtos, sem a autorização do proprietário ou criador, divulgação de fotos intímas (Lei Carolina Dieckman) e criação de Perfis Fakes, dentre outros.

Desta forma, podemos inferir que os crimes digitais avançam de forma muito rápida, acompanhando as inovações das tecnologias, e o Direito se modifica de forma metamorfa para resolver as novas lides que surgem nesse novo mundo digital, paralelo ao mundo real, ficando assim, provado que o Direito não é algo inerte, estático, onde o arcabouço jurídico se torna um verdadeiro Camaleão se adequando as cores, formas e necessidades de cada inovação, visto que as leis são frutos do seu contexto histórico, ou parafraseando o grande filosofo Cristão: As leis foram feitas para o homem e não o homem para as leis, se referindo assim a adequação das normas aos fatos novos que acontecem em sociedade.

 REFERÊNCIAS

Sachs, M., & Hilker, B. Cibersegurança e Direito Penal: uma análise do contexto brasileiro e alemão. Rev. Fac. Direito Univ. São Paulo, v. 113, p. 533-565, 2018.

Código Penal Brasileiro. Acessado em 29 de Dezembro de 2023, em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm

https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm

(STJ - HC: 81638 PA 2007/0087811-8, Relator: Ministro GILSON DIPP, Data de Julgamento: 12/06/2007, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJ 06.08.2007 p. 598)

BRASIL. PL 2793/2011. Disponível em: < http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=944218&filename= PL+2793/2011>

BRASIL. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - Cibercrime: CCJI sugere adesão do Brasil à Convenção de Budapeste - Disponível em: < http://ccji.pgr.mpf.gov.br/institucional/informes/cibercrime-ccji-sugere-adesao-do-brasil-aconvencao-de-budapeste >

LEMOS, Rafael - Roubo de fotos de Carolina Dieckmann acelera tramitação de projeto de lei sobre crimes cibernéticos.

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