O próximo pleito eleitoral no Brasil acontece no dia 2 de outubro de 2016, onde eleitores de todo o país irão às urnas para eleger prefeitos, vice-prefeitos e vereadores, como acontece de quatro em quatro anos, no entanto, neste próximo pleito passam a valer novas regras para as eleições municipais. As principais mudanças nas eleições de 2016 com relação às de 2014 foram determinadas pelo projeto de reforma política aprovado no Congresso em 2015 e sancionado pela presidente Dilma Rousseff em outubro do ano passado. Para comentar sobre essas mudanças no processo eleitoral, o jornal Valença Agora conversou com o advogado Alcides Bulhões, do escritório de consultoria jurídica e empresarial, MBC. Acompanhe a entrevista.

 

Dr. Alcides, o que o Sr. destacaria como as principais mudanças no processo eleitoral que passam a valer a partir deste ano?

anuncie_agoraUmas das principais mudanças no processo eleitoral de 2016 é a redução do tempo de campanha, que passou de 90 para 45 dias. Outra relevante mudança, é acerca do limite de gastos de campanha, as captações para a candidatura só poderão atingir 70% do maior gasto declarado para o cargo no pleito anterior, se tiver havido só um turno, e 50% caso tiver havido dois turnos. No segundo turno, esse valor será 30% do máximo arrecadado para o primeiro turno. Esse ponto visa reduzir os gastos de campanha e a disparidade entre os candidatos, porque se tinha notícia de que os candidatos que gastavam mais eram os que terminavam sendo eleitos. Outra mudança que considero muito importante é o financiamento de campanha que só poderá ser realizado por pessoa física, nessa eleição não poderá haver financiamento de pessoa jurídica, isso é decorrente das discussões acerca de algumas empresas que financiavam a campanha e depois iriam ser beneficiadas com contratos com aquele ente público ao qual o candidato que ele apoiou foi eleito. Outro ponto que chama atenção é o fato de que, embora tenha sido reduzido o prazo de campanha para 45 dias, existe a possibilidade daqueles que buscam ser candidatos serem considerados pré-candidatos e fazer uma espécie de pré-campanha. Nessa pré-campanha, o pré-candidato pode praticar vários atos com exceção de pedir voto. Ele pode ser entrevistado, participar de eventos, ir pra rua apresentar seus projetos, ou seja, abriu-se esse leque de possibilidades. A Lei não fixa um prazo inicial pra essa pré-campanha, então a pessoa pode-se dizer pré-candidato desde que ela sinta-se a vontade pra colocar seu nome numa disputa eleitoral, agora tem que se ter muito cuidado com a utilização deste direito de ser pré-candidato. É muito arriscado e é muito subjetivo o que ele pode e o que ele não pode fazer durante esse período de pré-campanha.

 

Dr. Alcides, o Sr. citou uma série de mudanças que já estão valendo para próxima eleição. Essas mudanças vão promover o que a sociedade almeja, ou seja, mais ética na política?

Há algum tempo a sociedade tem buscado uma moralidade pública, isso ocorre desde 94 com a alteração da Constituição, modificando um pequeno item na norma que trouxe uma questão bastante legal, que é a busca da moralidade e a retirada daquelas pessoas que tinham uma vida pregressa que a sociedade não aceitava. De 94 pra cá, nós tivemos uma alteração somente em 2010, com a aprovação da Lei da Ficha Limpa que fez com que aqueles candidatos que tivessem uma vida considerada improba e que fossem condenados criminalmente, e que suas contas tivessem sido rejeitadas, se tornassem inelegíveis durante um prazo de 8 anos. A Lei Ficha Limpa já foi uma mudança significativa que partiu da iniciativa do povo. Ali já houve uma demonstração de que se buscava uma maior moralidade, só que mesmo assim, os vícios de campanha permaneciam, nós estamos aí com o exemplo da Lava Jato, na qual se percebeu a existência de caixa 2, muitas empresas que financiavam as campanhas e depois eram beneficiadas com contratos com o ente público, e viu-se que este problema é de origem, as pessoas para serem eleitas gastam dinheiro, porque ainda há um vício em nosso país de que ganha quem faz a campanha mais bonita, ganha quem faz a caminhada com mais pessoas, quem faz a carreata com maior número de carros, e pra fazer uma campanha neste nível, tem de se gastar dinheiro, e não se gasta de onde não se tem. A minirreforma eleitoral também partiu de uma mudança da população, com as movimentações do ano de 2013 onde as pessoas foram às ruas exigindo essa reforma que, embora tenha sido uma reforma tímida, partiu do povo e busca também essa moralidade.

 

A partir dessa nova lei, o candidato que tem muito dinheiro não vai poder injetar esse dinheiro pra dar uma demonstração de mais força. O candidato terá que dar uma demonstração social de serviços prestados e mostrar que é digno de angariar votos para ter a possibilidade de ser eleito. Você acredita que isso na prática vai acontecer?

É uma situação que nós só poderemos dar uma resposta concreta após as eleições, porque como tudo é muito novo, certo é, que cada vez mais esses candidatos vão ter que se moldar aquilo que a lei está estabelecendo sob pena de não mais poder se candidatar. E essa é uma mudança de paradigma na qual tem que se observar acima de tudo, que, para se fazer uma campanha limpa, terá que se ter uma campanha mais inteligente. Hoje nós temos as redes sociais que dão uma visibilidade muito grande à campanha e que é uma fonte de propaganda barata, é um meio interessante. E, acima de tudo, quem se manter na campanha coeso, é quem vai levar melhor proveito.

 

No Brasil houve dois grandes divisores de água que provocaram todo o desencadeamento dessa mudança. Roberto Jefferson ao provocar a Lava Jato e o outro a ação popular, o povo participando, o que culmina nesse processo eleitoral que vai necessitar da avaliação do povo baseada em critérios éticos. Você acha que a população hoje está mais fiscalizadora, com seu senso crítico mais apurado pra tomar consciência desse poder que ela tem?

 

Eu não vejo a população ainda com esse potencial de fiscalizar, ainda se tem aquela perspectiva de que a população não entende como é que esse processo eleitoral se dá. O que eu tenho visto é um judiciário atuante, na medida em que o judiciário passou a ser mais independente, forte e atuante, nós temos observado que esta mudança está ocorrendo, é o caso da Lava Jato, é o caso de inúmeros prefeitos, governadores, inclusive a nossa presidenta, perdendo seus cargos em decorrência de procedimentos jurídicos, e lógico, tudo isso depende também da vontade do povo, mas acima de tudo, eu vejo a necessidade de uma conscientização geral, se não houver essa conscientização, essas questões tornam-se pontuais.

 

Como a população deve analisar e julgar políticos comprovadamente corruptos, como Eduardo Cunha, mas que se apresentam publicamente como um cidadão ético e íntegro. Quais são os critérios que a sociedade deve possuir para ter esse discernimento para análise?

A liberdade de expressão faz com que as pessoas pensem aquilo que querem, mas a mudança desse paradigma passa através da educação e do conhecimento, porque à medida que as pessoas passem a conhecer a si mesmo e formar uma convicção própria, elas deixarão de seguir aquilo que lhe é passado. Nós sabemos que a mídia tem um poder de influenciar a mente dessas pessoas que não tem um senso crítico. Com as redes sociais nós temos observado cada vez mais que as pessoas passam a ser uma espécie de papagaio, dizem aquilo que ouviram que é certo, mas não procuram saber a origem se está realmente certo, não procuram saber o porquê das coisas, então a meu ver, esta mudança vai passar pela conscientização das pessoas, sabemos que muitos dos nossos representantes que cometem ilícitos e são condenados, depois voltam a serem representantes do povo, e voltam como se fossem reis, então cada vez mais, eu vejo a necessidade de que haja essa conscientização e que esse preceito da moralidade não seja apenas feito no discurso.

 

Muitas mudanças já ocorreram como a extinção dos ‘showmícios’, faixas, trio elétricos, mas ainda há a necessidade de provocar um movimento pra conduzir o povo pra rua e o povo vai ser o grande responsável para implantação dessa nova cultura. Existe realmente a possibilidade de surgir uma nova cultura no processo político eleitoral?

Eu acredito que sim, vejo com certa cautela as mudanças, acho que ainda são pontuais, mas na medida em que esses candidatos passem a se conscientizar de que se permanecerem com as mesmas práticas dantes utilizadas, não mais poderão se candidatar, aí sim vai haver uma mudança de paradigma.

 

Essa nova cultura traz também uma questão fundamental, o prefeito não se comprometendo com grandes débitos, ele entra com mais isenção pra exercer o poder, automaticamente a sociedade vai ser mais beneficiada com ações públicas que precisam ser feitas?

Eu acredito que passa por aí, na medida em que os gastos são menores, ele não precisa se comprometer com empresas, nesse caso não se pode mais o financiamento de pessoa jurídica, ou com pessoas físicas, porque nós  sabemos que existem pessoas físicas com poder aquisitivo razoável, sendo que é importante pontuar que esse financiamento também tem um limite. A pessoa física pode doar somente 10% do seu rendimento líquido do ano anterior à eleição.

 

Suas considerações finais.

Eu espero enquanto advogado, enquanto jovem, que a nossa realidade democrática passe a ser cada vez mais moral, que pensemos sempre em melhorias para o nosso país. Que os gestores tenham uma maior preocupação com sua vida política porque, se por ventura, ele não conseguir ter a liberdade de fazer uma administração, ele vai passar a cometer os ilícitos que vai impossibilitar a sua futura candidatura. Se os políticos começarem a ter uma campanha cada vez mais limpa, enxuta, barata, pensada num plano de marketing barato e efetivo, as coisas tendem a melhorar, tanto do aspecto moral que pra população é fantástico, quanto do pessoal do próprio político para que não passe a ter a fama de pessoa ruim. Hoje é difícil encontrar uma pessoa de bem, como se diz muito no pensamento popular, que queira se envolver politicamente, porque ela não vai querer seu nome envolvido com situações que vão ensejar numa imoralidade pública. As reformas políticas existentes são boas, mas vão depender dos políticos envolvidos. Não basta apenas a lei, há a necessidade de que, quem esteja envolvido com esse processo, tenha esta visão e, além de ter essa visão queira praticar isso, mas esperamos sim, enquanto entusiastas desse direito eleitoral, que as coisas melhorem e que nas próximas eleições nós tenhamos tudo de bom pra uma sociedade e que o nosso país tenda cada vez mais a alçar voos e melhorias pra todos nós.

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