Eduardo Pereira - matutando

Eduardo Pereira

Historiador, jurista e psicanalista em formação.

 

Constância, moça bonita da localidade de Pinaré, desde mocinha ouvia sua mãe dizer: “Menina cuidado com os playboys”. De fato, nas décadas de 60/80 do século XX, era considerado playboy, o rapaz filho de boa família, entenda-se classe média ou classe alta, fazendeiros, comerciantes ou empresários que viviam na ociosidade, dedicando-se à prática dos mais completos prazeres carnais.

Etimologicamente, o termo playboy provém do inglês, play (jogar, se divertir) e boy (rapaz, moço). Na década de 1950, os Estados Unidos da América do Norte (EUA), passavam por uma fase de intensa prosperidade, naquela ocasião, homens filhos de família que haviam enriquecido, dedicavam-se exclusivamente ao desregramento e ao esbanjamento de dinheiro.

Já nos anos de 1960, os playboys, eram jovens ricos que herdaram bens e capitais das gerações abastadas passadas. Ditos jovens viviam como se a vida fosse uma grande festa; usavam roupas caríssimas, para as conquistas das mulheres, sem falar nos famosos carrões em que desfilavam.

No Brasil, por sua vez, o termo playboy, adquiriu um sentido pejorativo, degradante, para designar homens “bem-nascidos” e exibidos, que não trabalhavam e esnobavam outras pessoas(1). Era comum as moças bem criadas ouvirem das suas mães, das suas avós, ou até mesmo de uma tia encarregada da sua educação, a frase sempre ouvida por Constância: “Menina cuidado com os playboys”.

Ditos rapazes, via de regra muito bonitos, ao menos sob o ponto de vista eurocêntrico, cabelos bem compridos, filhos da classe média local, eram como se diziam na época: “os donos do pedaço”, equivalendo dizer os que mandavam na cidade. Na sua maioria residiam na capital do Estado, onde suas famílias desde tempos imemoriais tinham casas ou apartamentos, comparecendo em suas cidades natal com frequência, sempre a esbanjar dinheiro, não raro se metiam em confusões e arruaças.

Certo dia, já com vinte e cinco anos de idade, Constância, resolve perguntar a sua mãe: “Por que a Sr.ª sempre me diz para eu ter cuidado com os playboys?” A resposta de Dona Almerinda foi imediata: “Porque eu não quero ver filha minha falada, na boca da Candinha”. Como assim mãe? replica Constância.” Nós somos pobres, você é uma moça vistosa e esse filhinhos de papai, só querem se divertir e te usarem, acorda para a vida menina!”. Essa preocupação da dona Almerinda, era pertinente para uma época em que as filhas de família deveriam casar-se virgens.

Esse antigos playboys brasileiros, ao contrário dos seus pares estadunidenses que receberam vultosas heranças e viviam a esbanjá-las, acostumaram-se os daqui viverem às custas do Estado que patrocinava suas famílias, com empregos sem concursos públicos, cargos públicos eletivos, empréstimos concedidos por bancos estatais, etc.

Observa-se que na atualidade os antigos playboys, hoje senhores com cabelos grisalhos foram amplamente amparados pelo mesmo Estado patrocinador das suas famílias. Uns estão no exercício dos mais diversos cargos e funções públicas, outros são empresários, fazendeiros ou industriários, tendo como patrocinados, convém redizer-se o Estado.

Hoje ao transitar pelas ruas ou estradas, veem-se como os playboys tomaram uma nova configuração, evidente não mais com esse termo. Desfilam em suas motonetas a fazerem “piruetas”, não são dados ao uso do capacete, alguns sem camisas, esguios, entretanto, ao modo dos  seus antecessores são dados aos prazeres efêmeros, não gostam de trabalhar. Vale dizer que não receberam nenhuma herança e hipoteticamente, supõe-se que são patrocinados por um pai ou mesmo um avô, na sua maioria aposentados.

Vale ressaltar que, principalmente na última década, o salário mínimo teve um ganho real nunca visto antes. O gráfico(2) a seguir demonstra a referida evolução:

Evidentemente que num mundo globalizado, essa alta do salário mínimo (base de remuneração da maioria absoluta dos aposentados) em relação ao Dólar, além da implementação de diversas políticas públicas, possibilitaram o acesso aos bens de consumo por parte de parcela da população dantes excluída, no caso em particular motocicletas de baixa cilindradas que deixou de ser artigo de luxo.

Evidente que não somente por essas razões, mas por muitos outros motivos de ordem socioeconômicas, ou quem sabe até mesmo da geopolítica, ou ainda por um projeto de Estado, que não é objetivo deste texto discutir, surge em cena um novo ator social, chamado de  nem nem nem (nem trabalha, nem estuda, nem procura emprego).

Consoante o Jornal o Estadão(3), em 2009, o percentual de jovens entre 18 e 24 anos de idade em tais condições era 15%, saltando para 17% no ano de 2012. Referidos índices são baseadas em pesquisas realizadas pelo economista Gabriel Ulyssea do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA).

Zélia Nolasco Freire(4) classifica a referida geração como “geração perdida” que cresceu longe da escola e do trabalho. Informa, ainda a mesma autora que termo é uma tradução livre do espanhol, onde é conhecida por geração “Ni Ni”, “ni estudian ni trabjan”; na Itália é chamada de “mammone” por que não larga a saia da mama e no Reino Unido é chamada de “Kidult”.

Assim, não se trata de uma questão isolada apenas do Brasil, onde segundo Freire, para cada 10 brasileiros com idade entre 18 e 20 anos, 2 estão à margem da inclusão educacional e laboral, mas de uma tendência mundial que, em países periféricos e de uma mentalidade colonial-escravista, in casu, o Brasil, tende a agravar-se, haja vista as desigualdades socioeconômicas  assombrosas.

 

NOTAS:

(1) https://pt.wikipedia.org/wiki/Playboy_(estilo)

(2) Disponível em: <https://brasilfatosedados.wordpress.com/2010/10/01/renda-salario-minimo-em-dolaru-evolucao-nominal-e-crescimento-percentual-por-mandato-1995-2010/>.

(3)http://economia.estadao.com.br/noticias/geral,cresce-a-proporcao-de-jovens-nem-nem-nem,1619076.

(4) http://www.douradosagora.com.br/noticias/opiniao/geracao-perdida-nem-nem-zelia-nolasco

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